domingo, 30 de agosto de 2009

A hora e a vez das máquinas




Aproveitando o sábado ensolarado, eu e um amigo decidimos conhecer o Parque Villa Lobos. Já de começo, fiquei surpresa com a questão de acessibilidade do lugar...

O parque possui uma entrada exclusiva para carros. Preciso insistir na questão: ENTRADA EXCLUSIVA PARA CARROS (leia-se: proibida a entrada de pedestres). Justamente num PARQUE!

Algumas pessoas podem até alegar para a questão da segurança dos transeuntes. Mas, convido estas pessoas a refletirem. Em um estacionamento, cheio de carros parados e vagas apertadas lado a lado, não há perigo em pedestres circularem por lá. A velocidade na qual os veículos se locomovem não apresenta riscos de atropelamento.


Conclusão: eu e meu amigo tivemos que caminhar algumas centenas de metros, numa calçada estreita que acompanha a avenida Professor Fonseca Rodrigues, onde carros e ônibus circulam numa velocidade muito mais ameaçadora para pedestres.

Durante a caminhada, refleti sobre o contra-senso da situação. Como pode haver em um parque um espaço exclusivamente destinado a máquinas? Quer dizer que a máquina pode mais que o ser humano?


Refletindo um pouco mais, percebi que o estacionamento permitia sim a entrada de humanos, mas somente daqueles que estivessem com seus carros de estimação. Afinal, as cidades modernas são construídas e pensadas em termos de acessibilidade automobilística. Isso estimula os frenquentadores do parque a irem de carro. É como se a área para quem quer andar a pé ou fazer seu cooper se restrinja ao ambiente florido do parque. De volta à vida real, à rua, não se pode esquecer de fechar as janelas, travar as quatro portas e ligar o rádio para abafar o som da cidade.


Os movimentos sociais a favor de formas alternativas de transporte ganham força conforme a condição do trânsito nas cidades se torna insustentável. Para quem se interessar, vale à pena consultar o site da Bicicletada. No dia 22 de setembro acontece uma grande mobilização em todo o planeta; trata-se do Dia Mundial sem Carro.

Muito interessante é o jogo de palavras que o movimento francês CarFree France faz para mobilizar as pessoas a respeito de como o carro toma o espaço público e desvaloriza a acessibilidade de pedestres. Assim diz o cartaz: Nós queremos parques, não estacionamentos. A cidade é feita para as pessoas, não para os carros.

Creio que se essa reflexão fosse mais constante, o estacionamento do Parque Villa-Lobos seria um espaço com menos máquinas estacionadas e permitiria a livre circulação de pessoas.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Mesmice nossa de cada dia, não nos dai hoje, Senhor


O mundo é muito grande, não é mesmo? Imagine a quantidade de rostos que vemos todos os dias, desde o momento em que saímos de casa até a hora em que fechamos os olhos para dormir para recarregar as energias e iniciar o dia seguinte. Vemos vizinhos, o porteiro do prédio, os saudáveis que fazem caminha pela manhã, os camelôs se estabelecendo pra vender seus produtos. Um mendigo olha atônito o movimento dos carros, o vai-e-vem de gente - a vida social é uma vitrine, um produto que ele só observa pelo lado de fora. A padaria da esquina tem seu movimento típico: uma pausa no caminho do trabalho para um café, sempre vendo rostos e mais rostos: a TV sempre ligada, um jornalista anuncia os crimes da magrugada. Muitos rostos, e esse foi só o techo matinal.

É tanta gente no mundo! E a pressa cotidiana impede que conheçamos tantas vidas interessantes.

Na banca de jornal, há muitos rostos também. Anúncios publicitários, revistas femininas, a vida explorada das celebridades e as notícas. Divulga-se em massa a imagem das mesmas caras. Toujours la même chose. Monótono, entediante.

Eu, que acordei tão ávida de ver rostos novos, vidas novas, histórias novas, acabo de ser puxada para o esgoto, numa força em direção ao ralo.Idéias repetidas, o mesmo visual, sempre mesmo, das mesmas coisas que nunca se inovam. Ai, minha inspiração acabou!!!!!!

sábado, 22 de agosto de 2009

Addendum


A transmissão de idéias é um processo complexo.

Para transmitir é preciso receber. Aquele que hoje transmite, já foi necessariamente um receptor.

Acho importante fazer esta reflexão, pois tudo aquilo que eu transmitir -no caso, por meio de postagens - terá sido resultado da minha absorção particular de um fato.

Esse processo, a meu ver, depende muito mais dos sentidos e menos da razão.

Cada um tem a sua percepção de realidade.

António Damásio, médico e intelectual português, tem como objeto de estudo as emoções humanas. Ele é autor do livro O erro de Descartes. Para Damásio, a famosa frase "penso, logo existo" não capta a verdadeira condição humana. Ele vai mais a fundo e percebe que os sentidos dão forma à racionalidade. Reformulada, a frase ficaria assim: sinto, logo existo.

Quanto mais interpretações houverem, mais rico um fato se torna. Afinal, o fato é o fato, nada mais. O que muda é a ótica sob a qual ele é analisado.

Para este blog, eu escrevo a minha percepção dos fatos, uma análise possível entre várias outras.

Nada absoluto, nada fixo. Sempre mutável, questionável, variando de acordo com a percepção.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Um parto




Hoje começo a postar. E considero isso um nascimento.
A idéia que motivou a geração deste blog foi a sensação de anonimato.
Vivo num mundo cheio de dinâmica, de interação, de quebra de paradigmas.
Todo esse ambiente de inovação e vanguarda me parece preso a um discurso. Ponho o pé pra fora de casa e só vejo caos, imobilidade, individualismo e a impressão de estar com as mãos atadas em plena transformação mundial.
Para garantir um lugar no mundo, é necessário partilhar do pensamento único.
O que é considerado informação no século XXI?
A padronização da notícia, a massificação da informação contribuem para manter tudo como está. Mas é preciso buscar soluções.
Eis a solução que encontrei: escrever sobre o anônimo, sobre aquilo que não é constantemente abordado, sobre uma sensação, uma cena qualquer - comum ou diferente -, que desperte algo inusitado em quem a veja. Enfim, quero tratar de histórias dissolvidas na imiscuidade do mundo moderno, tão anestesiado pelo discurso de que tudo está evoluindo.
De fato, não estou satisfeita em viver minha vida no mundo como ele está hoje. Quero transformar tudo ao meu redor, sempre visando o bem, sempre com amor. "Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura", já disse Guimarães Rosa.
E foi com muito amor* que este parto aconteceu.
*Gostaria de ressaltar que utilizo o termo amor não no sentido de afeição constante e calorosa. Karen Armstrong, em seu livro A grande transformação: o mundo na época de Buda, Confúcio e Jeremias, ressalta o fato de que o mandamento amor nos tratados do Oriente Médio significava ser prestativo, leal e ajudar o próximo concretamente. Amor, portanto, não deve ser um sentimento demasiado utópico e idealizado; deve, sim, estar ao alcance de todos. Não é algo sentimental, mas prático. Assim eu me expresso.